sexta-feira, 19 de julho de 2013

Comida de república. Jantar de ontem.

As coisas na cozinha, segundo meu entendimento, funcionam assim: quem realmente se interessa por culinária, com a mesma dedicação e cuidado que prepara um risoto milanês, por exemplo, também faz um simples feijãozinho.A cozinha exige atenção e capricho, acima de tudo, para que o resultado final seja especial, independentemente do prato que estiver sendo feito, e esse capricho se revela pela marca pessoal que o cozinheiro imprime a tudo o que faz; é o "toque do chef" que hoje é bastante festejado, ou seja, o que faz a comida ser boa é o que o cozinheiro acrescenta de si mesmo (o melhor de si, na verdade), com o máximo de presença e cuidado desde a escolha, compra  combinação dos ingredientes até a apresentação final do prato, passando pelo o processo, suas técnicas e etapas.

 Minha filha mais nova está passando férias em Florianópolis e, assim que ela foi, meu filho comentou: - "vamos passar 1 mês em clima de república, aqui em casa, já que vamos ficar sózinhos, né pai?". E de fato estamos desde o início de julho em clima de república já que, com exceção de um almoço que preparei para um amigo no domingo retrasado, quase não tenho cozinhado. Ontem eu queria celebrar esse nosso tempo de república e fiz, junto com meu filho, um prato que ele me ensinou e que foi por ele e seus amigos adaptado de uma preparação simples que eu chamo de "careca de padre", no período em que ele morou em Pelotas e cursou a Universidade Federal de lá, e que também tem a mesma mecânica do "escondidinho", ou seja, batata cozida/mandioca e carne em camadas, geralmente finalizada com molho de tomate, adaptação essa que consistiu em substituir a carne moída por linguiça calabresa.

Segundo o Diogo, no sul eles utilizavam uma linguiça caseira largamente encontrada em Pelotas, sêca, chamada pelos gaúchos de "salsichão". A nossa "república", nome que eu acabei de dar ao prato de ontem, ficou deliciosa e foi acompanhada de um arroz com pimenta cambuci, também conhecida como "chapéu de bispo." A batata que eu usei foi a comum, aquela boa para fritura, de casca bem clara e fina, embora o ideal nesse caso seja utilizar uma sêca, como a asterix, mas no mercado não tinha. Como já disse, ao invés da carne moída da "careca de padre" (que no escondidindo clássico é carne seca), usamos linguiça calabresa defumada industrializada, já que não sei onde encontrar essa chamada de "salsichão" pelos gaúchos, frita em sua própria gordura e acebolada, temperada com sal, orégano e pimenta calabresa, só um pouquinho. A batata cozida,amassada e temperada ainda quente também mereceu um salzinho e um fio de azeite de oliva, mas somente isso pois a calabresa e o molho já foram bem temperados, este último comprado pronto, mas de boa qualidade e brevemente fervido juntamente com uma cebola refogada também em azeite de oliva. Entre as camadas de batata e linguiça colocamos queijo mozzarella, desses comuns mesmo, ralado no ralo grosso.

Nosso jantar ficou bem bacana e o fato simples de o arroz estar levemente picante fez uma grande diferença, assim como o queijo bem derretido no final. Sentimo-nos, eu e meu filho, especiais, em um dia especial, e é isso realmente que a cozinha faz: quando nos sentamos para comer e o fazemos com prazer e ceriônia, nos lembramos que somos merecedores das benésses da vida, destinatários do melhor que o mundo tem a dar, filhos únicos do Pai e, desse jeito, a refeição é uma celebração das pessoas pelas pessoas, do homem por ele mesmo. Durante a preparação eu me encarreguei da república e o Diogo do arroz. Enquanto estávamos cozinhando me lembrava do menino que ainda não tinha 1 aninho e eu buscava na escolinha no final da tarde, na Rua Itaqueri, e que vinha no colo da pajem vestido de jaquetinha preta com lã de carneiro na gola, que sorria quando me via. Hoje estamos juntos na cozinha, e na vida desde sempre e até sempre.

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